quinta-feira, 3 de julho de 2008

Já acordaste sorrindo pela manhã? Pois é, o dia será uma droga...


Ainda estava chovendo quando Ela acordou. O relógio marcava 3 horas, mas Ela sabia que já passavam das quatro. Revirou-se inutilmente na expectativa de voltar a dormir, mas acabou se dando por vencida e pôs-se de pé. Não se via sequer um resquício de luz indicando que o sol voltaria, muito pelo contrário, parecia até que a escuridão da rua adentrava no quarto produzindo um ambiente macabro. A ausência de móveis e a má organização do espaço geravam um estranho desconforto, com o qual Ela parecia não se importar mais. Há algum tempo que ela não se incomodava com quase nada, o quê, aliás, foi tudo que lhe restou...

Convencida de que o dia não seria dos melhores, parou um instante para observar a água da chuva que escorria pelo vidro da janela. Tudo parecia tão sereno e a cidade parecia mais limpa. Ela suspirava sem emoção alguma, apenas para sentir o ar fresco enchendo seus pulmões. Agradavam-lhe os dias chuvosos, unicamente por desgostar dos secos. Sol, calor e luminosidade, extremamente apreciados por Outros, para ela eram, dos dias, os piores.

O som do vidro se partindo e o café escorrendo pela toalha tiraram sua concentração da chuva, um copo a menos, o segundo a se partir naquela semana, talvez devesse beber chá. Quem sabe haja algo que ainda não tivesse notado, como uma rachadura, ou uma doença de copos, alergia ao café, talvez. Enquanto observava o líquido escorrer até o chão, pensou em se levantar e limpar tudo, mas o contorno da poça que se formava a intrigava. Primeiramente parecia um simples borrão, mas, à medida que mais gotas caiam, o borrão ganhava formas, e eram formas interessantes que Ela tentava aflitivamente decifrar. Quando o chão estremeceu sob seus pés, o desenho, que tanto a maravilhou, se perdeu. Foi então que Ela percebeu: os tremores estavam ficando freqüentes a cada dia. Bom, isso realmente a perturbava.

Quando tentou sair, percebeu que a porta se encontrava trancada e acabou voltando ao café. Após completar a xícara, percebeu uma coloração estranha no líquido, haviam bolhas de tons esverdeados nas bordas do recipiente. O primeiro gole foi o bastante para que todo pouco sono remanescente se fosse; os seguintes serviram apenas para manter o gosto suave e doce na boca. Café sempre fora sua bebida favorita, contudo, nos últimos tempos, vinha sendo difícil consegui-lo. Com o aumento da Fenda e conseqüente diminuição da pressão atmosférica, as clínicas do café estavam sofrendo consideráveis perdas; seu maior temor era que se extinguissem.

O telefone tocou, e Ela o fitou como se não estivesse ouvindo sua ladainha irritante. Arrastou-se até ele entre resmungos, mas, assim que tocou no aparelho a campainha fez-se presente. Uma vez que a porta encontrava-se trancada, Ela decidiu-se por atender ao telefone e ignorá-la. Quem se encontrava na outra linha não parecia estar feliz, falou com voz rouca em tom baixo, apenas meia dúzia de palavras sem nexo e então desligou. Isso a fez sorrir.

Atrás do sofá encontrava-se a chave que a deixaria sair. A princípio Ela não sabia disso e resignou-se a procurá-la dentro da geladeira. Lá encontrou um antigo pote de margarina; pensou em defenestrá-lo, mas lhe faltou ânimo. Virou a cabeça para o lado, no intuito inútil de melhorar uma dor no pescoço, isso a fez ver, enfim, a chave. Não era um molho grande, apenas uma chave, um molho de uma chave que a deixou pisar na rua...

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